quarta-feira, 24 de março de 2010
A Teoria de Francisco
Recordo-me de você. Repetia a palavra “presente” após chamar por meu nome. Depois então que descobristes que era irmão do Pereira; foi como as nuvens que dividem um mesmo canto do céu. Familiares e cheias de formas, belas e intrigantes. Chamar-me de Pereira era para mim uma amigável responsabilidade que me davas, uma maneira peculiar de tua alma a me dar força, sem que eu percebesse isso.
Suas brincadeiras, seu jeito sério, bravo ás vezes, eram a tradução do seu íntimo querer, que o espaço vazio na mente de seus alunos fosse preenchido por conhecimento. Disciplina e aprendizado eram as marcas que registravas em nós, sempre com uma boa dose de humor; aquele que vem por se sentir feliz naquilo que se sabe fazer. E fazias com mestria, como quem foge do tempo pelas vias da gramática.
Ajudaste-me a gostar dos caminhos das palavras. E em meio a verbos, figuras de linguagem e orações, muito aprendi contigo. E hoje, um capítulo do que fostes se registra em mim. Claramente apenas um pedaço.
Conjugaste com alegria o verbo nascer, quando dividiu conosco sua felicidade. A esposa estava grávida, mais uma vez, outra menina! Deveria ser professora ...
Esse era o seu diferencial, tão importante. Partilhar o coração ajudava a compreender a matéria. Os lápis escreviam mais que palavras, as borrachas apagavam mais que erros de escrita.
Recordo-me de sua alegria em descobrir depois de alguns anos, que eu iria cursar o mesmo trajeto que percorreste. E o melhor, voltarias a ser meu professor em apenas quatro meses. É, eu já havia crescido mais, não era mais aquele garoto do primeiro colegial, a faculdade me sorria, e olha quem ali eu reencontraria...
Recordo-me também de sua apreensão, pela notícia de que talvez eu deixaria a faculdade. Lembro-me daquele nosso encontro casual no corredor, quando me disse:
- Não desista, você já é um vencedor!
Essa foi a sua simples e extraordinária teoria. A amizade.
É verdade, muito aprendei com você. E acredito que até hoje não saberia o que é um paradoxo se não me explicasses com seu precioso afinco. E hoje eu sei, graças a você.
Sei também, e penso que foi um grande paradoxo a sua repentina partida. Sim meu amigo, essa vida é uma constante de vírgulas, pontos finais, pontos de exclamação, interrogação e reticências...
Ainda estou na sala de aula. Cursando justamente o ano letivo em que você deveria ser meu professor. Somos assim, como a neblina que surge e logo se dissipa. Sei que não podes me ouvir de onde quer que seja, mas guardo no coração essa sua recordação. Tenho ainda saudade, quando me lembro de você, a cada nova palavra que descubro seu significado...
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Olá, Pereira.
ResponderExcluirTchau, Pereira.